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A ação de instrumentos NiTi...

Infecção hospitalar

As expressões Consentimento Esclarecido, Consentimento Voluntário, Consentimento Informado, Consentimento Pós-informado, Consentimento Após-informação, Consentimento Livre e Esclarecido, retratam mais do que a simples manifestação do paciente após ter recebido todas as informações sobre os riscos, benefícios e custos do tratamento que irá receber ou da pesquisa em que irá participar; devem ser respeitados seus próprios princípios de autonomia e sua vontade emaceitar ou não o que lhe for proposto.

Este documento foi idealizado pela primeira vez na Alemanha em 1931, quando experimentos em seres humanos eram rigidamente controlados através de um instrumento legal que obrigava a utilização do consentimento informado3. Silva7 (1997) ilustra como expressão de vontade a frase em latim: “Nihil volitum quem praecognitum” (“Nada é querido sem antes ser conhecido”), sem no entanto deixar de já permitir que seja estabelecido conflito entre o direito do paciente1, desconhecer, por exemplo, todas as alternativas do tratamento, e do profissional, que abre mão do direito de indicar a melhor opção em função da escolha do paciente2, que, portador de todas as informações sobre técnicas, biomateriais, qualidade e custos, mesmo assim faz a opção pela de valor mais baixo, esquecendo o valor agregado ao tratamento, levando em consideração apenas o aspecto financeiro.

Um dos maiores conflitos entre terapêuticas oficiais e vontades populares, exemplo clássico de exceções ao princípio da necessidade de consentimento, ocorreu no Brasil – Rio de Janeiro, entre os anos de 1903 a 1908, quando Oswaldo Cruz encetou campanha contra a febre amarela, a peste bubônica, e a varíola. Contra esta, iniciou-se campanha obrigatória de vacinação para a população que se revoltou contra a mesma e, em 10 de novembro de 2004, promoveu um violento protesto que recebeu o nome de Revolta da Vacina e que durou vários dias, com saldo de vários mortos e dezenas de prisioneiros6.

Por outro lado, o Código Penal Brasileiro5, em seu capítulo VI, dos crimes contra a liberdade individual, seção I, dos crimes contra a liberdade pessoal, constrangimento ilegal, art. 146, “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que lei permite, ou FAZER O QUE ELA NÃO MANDA”. Parágrafo 3º. Não se compreendem na disposição deste artigo, inciso I, “a intervenção médica ou cirúrgica sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida”.

Em determinadas situações óbvias, é clara a necessidade de intervenções rápidas, mas em algumas situações, o  risco não é iminente e pode permitir ao profissional decidir, por seu livre arbítrio, a indicação de terapêutica sem prestar informações ao paciente ou sem o respectivo consentimento. Vanrell9 (2002) também cita as exceções ao princípio de necessidade de consentimento vinculadas à predominância do interesse público sobre o interesse individual em prováveis legitimações: por razões sanitárias (excepcionais em Odontologia); por interdição (menor de idade, surdos-mudos sem intérprete, pacientes com alterações neurológicas, paciente inconsciente ou em coma); por incapacidade do paciente ou sem familiares próximos que possam consentir no tratamento. Por este motivo, as pesquisas envolvendo seres humanos devem ser desenvolvidas preferencialmente em indivíduos com autonomia plena. Indivíduos ou grupos vulneráveis não devem ser objeto de pesquisa quando a informação desejada possa ser obtida através de indivíduos com plena autonomia, a menos que a investigação possa trazer benefícios diretos aos vulneráveis. Nestes casos, o direito dos indivíduos ou grupos que queiram participar da pesquisa deve ser assegurado, desde que seja garantida a proteção à sua vulnerabilidade e incapacidade legalmente definida. Também é digno de menção o chamado DIREITO DE NÃO SABER por parte do paciente em situações que não envolvamos interesses de ordem pública9, não prejudiquem a terceiros e que a mesma conste em um documento específico, do próprio termo de consentimento informado, ou na própria ficha clínica. Por exemplo,a remoção de massa tumoral na cavidade oral consentida pelo paciente, mas sem que o mesmo queira saber se há malignidade ou benignidade do processo. No entanto, é imperativo que a concretização da renúncia seja estabelecida formalmente em documento específico, no próprio termo de consentimento informado ou na própria ficha clínica. Como se trata de uma condição estritamente pessoal, o princípio da autonomia pode ser também reafirmado na revogação do consentimento, fundamentado na liberdade de consentir, e que pode ser aplicado no sentido inverso, com a retirada do mesmo. Isto, no entanto, não significa que a retirada ou revogação do consentimento deva ser obedecida sempre, como, por exemplo, aplicada em intervenção em andamento e que coloque em risco sua saúde ou vida. Considera-se intervenção todos os atos e procedimentos praticados com finalidade preventiva, de diagnóstico, de tratamento, reabilitadores ou de pesquisa9. Para que o profissional responsável pela intervenção fique respaldado em relação à revogação do consentimento, o mesmo deve conter a finalidade da intervenção contra a natureza da mesma, as suas consequências e os riscos que comporta.

Discussão 

Dentre outros, o Código de Defesa do Consumidor1 (CDC), Lei 8.078/90, que cumpre determinação do art. 5º da Constituição Federal, enquadrou o cirurgião-dentista como prestador de serviços e o paciente como consumidor, trazendo distorções e conflitos graves para os profissionais de saúde no Brasil. No art. 6º, III, cita que a informação deve ser adequada e clara sobre diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem. Vale lembrar que em seu art. 14, o CDC penaliza o cirurgião-dentista caso venha a acontecer a possibilidade de que as informações prestadas sejam insuficientes sobre o desenvolvimento e riscos do serviço. No entanto, o conflito é baseado no fato de que o CDC inverte a obrigação do ônus da prova, passando-a para o cirurgião-dentista. Também é afirmado no Código de Ética Odontológico2, art. 6º, II, “deixar de esclarecer adequadamente os propósitos, riscos, custos e alternativas do tratamento”. Verifica-se, portanto, que, para o cirurgião-dentista, é necessário INFORMAR E PROVAR que informou, levando-se em consideração dois fatos relevantes:

O primeiro, no que se refere ao paciente, que, independente de erro, complicação ou mau resultado, o legislador ou magistrado em casos de dúvida, levará em consideração a palavra do paciente que é considerado como consumidor hipossuficiente e desprotegido e que deve receber da Justiça o benefício da inversão do ônus da prova. Por exemplo, a palavra de auxiliar de consultório ou de secretária, não é levada em consideração no testemunho, tendo em vista que há uma relação de subordinação com o cirurgião-dentista. Fica claro então que, o preenchimento adequado de prontuário e dos respectivos termos de consentimento esclarecido, é realmente a forma de produção de provas e cumprimento de legislação que o profissional pode lançar mão em situações de conflito. E ainda que, o termo só tem validade se for assinado pelo paciente ou pelo seu representante legal, como forma de demonstrar, acima de tudo, a preocupação do profissional para com o paciente.

O segundo, em relação ao Código Civil, cujas recentes modificações tornaram impraticável, para o profissional, o uso de seguro de responsabilidade civil, com uma série de desvantagens para o cirurgião-dentista, incluindo a necessidade da quebra de sigilo profissional. Portanto, como a relação profissional paciente pode falhar, é sempre importante que seja formalizado o documento de consentimento, escrito de forma clara, e sempre contendo, por escrito, tudo que for informado, como, riscos, opções de tratamento e cuidados posteriores. Outras cautelas também devem ser tomadas, inclusive, não medicar por telefone, pois afinal, assumir riscos desnecessários não é prova de habilidade e sim de imprudência. Souza8 (2006), no entanto, afirma que não há como atribuir ao cirurgião-dentista um evento danoso, caso o profissional não tenha agido: com imperícia4, que representa inabilidade técnica, falta de perícia na atuação profissional, ou despreparo profissional; com imprudência, que é agir de forma precipitada, açodada, atitude comissiva; e, com negligência, que se tratada indolência no atuar, da manifestação de preguiça psíquica e de falta de diligência. Em suma, é um ato omissivo. Cabe lembrar que outro conflito, independente de consentimento, é a maneira como alguns magistrados querem considerar as especialidades odontológicas como uma obrigação de resultados, a saber; Dentística, Odontologia em Saúde Coletiva, Odontologia Legal, Patologia Bucal e Radiologia, e como uma obrigação de meios, Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, Endodontia, Odontopediatria, Periodontia, Ortodontia, Prótese Bucomaxilofacial, Estomatologia, Disfunção Têmporomandibular e Dor Orofacial, Odontologia do Trabalho, Odontologia para Pacientes Especiais, Odontogeriatria, e Ortopedia Funcional dos Maxilares, quando da formulação dos contratos.

Conclusão

A Odontologia não pode oferecer, de modo definitivo, garantias para o paciente nos mesmos moldes de bens ou serviços previstos na legislação, pelo fato de tratar-se de ciência não exata, e mesmo com termo de consentimento esclarecido assinado, ainda podem persistir conflitos entre os diversos códigos normativos da profissão.

Referências

1. Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, alterada pela Medida Provisória nº. 1890-63, de 29 de setembro de 1999.

2. Código de Ética Odontológica (aprovada pela resolução CFO-42 , de 20 de maio de2002). [acesso 02 jun 2006]. Disponível em: http://www.cro-df.org.br/etica.htm.

3. Código de Nuremberg. Trials of war criminal before the Nuremberg Military Tribunals. Control Council Law 1949;10(2):181-182 [Acesso 17 maio 2006]. Disponível em http://www.ufrgs.br/bioetica/nuremcod.htm.

4. Delgado RM. O valor do dano moral. 2ª ed.São Paulo: JH Mizuno; 2005.

5. Oliveira J. Códigos penais. Legislação com nota remissiva. 25ª ed. São Paulo: Saraiva;1996.

6. Scliar M. Uma guerra contra a morte. Rev Nossa História. 2005; 2(21):14-9.

7. Silva, M. Compêndio. de Odontologia Legal. Rio de Janeiro: Medsi; 1997.

8. Souza NTC. Teoria da culpa no erro médico. Jus Navigandi. 2001;5(49) [acesso 02 jun2006]. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=614>.

9. Vanrell JP. Odontologia Legal & Antropologia Forense. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002.

Autores:

Mario Tavares Moreira Júnior

Rodolfo José Gomes de Araújo

Marília Fagury Videira Marceliano

Jader Moreira da Silva

Regina Fátima Feio Barroso



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